PORTFOLIO: abril 2009

quinta-feira, 16 de abril de 2009

VIAGEM AO QUOTIDIANO

Miguel Baganha, técnica mista s/ tela | 2008

A referência à pintura em Miguel Baganha passa por diversos ajustamentos e percursos. Esta obra, que tanto deve à fotografia e à experiência com materiais dúcteis, releva igualmente de processos relativos ao imaginário, a um caminho simbólico dos elementos plásticos. Seria demasiado fácil falar de Orwell, do seu “1984“ e respectivo “Big Brother” – um olhar vigilante e generalizado sobre o quotidiano das pessoas, base de proibições, censura, normalização dos actos das palavras pronunciáveis. Este terror sobre a evolução do mundo tem provocado o aparecimento de obras eloquentes sobre os apocalipses diários e o derradeiro, o que nos dizem vir seleccionar os bons dos maus. O problema é mais complexo, mesmo neste quadro de Baganha, no qual, com efeito o raccord entre dados da representação junta o olho omnipresente à representação dos meios urbanos e das pessoas, mas justamente quando estas se diluem nas gares do metropolitano parecem ter ganho, sobre a massa sombria da cidade em horizonte, um destino baço de rotinas e automatismos.

Rocha de Sousa

CONSTRUPINTAR

Vivemos um tempo em que se confere grande predomínio ao factor imagem e se limita telegraficamente o texto: tudo tem que ser simples e "acessível a todos". Entre a palavra ausente e o perfil fugaz das coisas, o mundo ou aparece distorcido pelo nivelamento avassalador ou destituído de significação. A quem ocorre a falsa fatalidade desta contingência, pelas sucessivas vagas de normas redutoras sobre a apresentação do real, surge paralelamente a necessidade de obter um novo vocabulário figurativo capaz de tornar corpórea a própria sombra - ou, pela reconstrução das várias escritas, ir ao encontro desse visível de que nos falava Paul Klee, o outro lado do espelho quebrado, essa outra imagem susceptível de reactivar uma primeira lembrança contra a amnésia e a rapidez subliminar dos consumos imperativamente instituídos. - Rocha de Sousa